Importante parte dos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para moradia popular não foi utilizada em 2021. De um orçamento de R$ 59,2 bilhões para o setor, R$ 6,3 bilhões nem chegaram a ser demandados pelos agentes financeiros.
O economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clóvis Scherer, lamenta a desaceleração das contratações pelos bancos e levanta algumas hipóteses que podem explicar a situação. Uma delas é a economia do país – a alta inflação, o desemprego e a falta de renda das famílias inviabilizam a aquisição da casa própria. “A renda está tão baixa que mesmo com um financiamento subsidiado a juros baixos, mesmo com subsídio que o Fundo de Garantia concede às famílias de renda mais baixa, mesmo assim elas não têm condições de buscar um financiamento”, considerou.
Outra suposição é enrijecimento no processo de análise e exigências para financiamentos em função da inadimplência da população de menor renda. “O aumento da inadimplência pode estar sendo encarado pela Caixa [agente operador do FGTS] como um desestímulo para buscar maior contratação. Esta é uma outra hipótese que deve ser analisada”, avaliou.
Mais uma possibilidade foi considerada pelo economista, segundo diagnóstico do Conselho Curador -em 2020, o crédito habitacional financiado com recursos da Caixa Econômica estava mais atrativo – as exigências e procedimentos para contratação estavam mais simples e a taxa de juros era bem competitiva com a do Fundo de Garantia. “Um exemplo é a linha pró-cotista, que atende trabalhadores com conta no FGTS, mas com renda familiar acima de 7 mil reais. O grupo 3, com renda acima de R$ 4 mil, estava com baixa demanda. Isso mostra que este público estava preferindo outras linhas de financiamento”, explicou Scherer.
O economista enfatiza que estas são algumas possibilidades que devem ser analisadas. No entanto, o que é importante a observar, segundo Scherer, é que a contribuição para habitação popular não se concretizou inteiramente conforme planejado pelo Conselho Curador. “Isso não é desejável. Mesmo que os recursos não contratados tenham sido aplicados em títulos públicos ou não tenham gerado prejuízo aos trabalhadores, o fato é que a função para a qual os recursos foram planejados não foi cumprida”, disse.
Os recursos que não foram demandados estão no planejamento financeiro do Fundo e são mantidos aplicados em títulos públicos de curto prazo e liberados quando necessário.
Sem confirmação dos fatores que levaram à situação, o representante dos trabalhadores no Conselho Curador, José Abelha Neto, informou que o Conselho vai solicitar à Caixa explicações sobre a redução da execução dos recursos. “O Conselho vai se reunir em fevereiro e vamos pedir uma posição da Caixa Econômica para saber, de fato, o que vem acontecendo, inclusive para sabermos o que fazer para melhorar a aplicação dos recursos”, destacou.
Abelha Neto também destacou que o Conselho já monitorava a situação e estabeleceu algumas medidas para estimular maior contratação em 2022, como redução da taxa para grupos de menor renda.
O presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), Sergio Takemoto, lamenta a situação. “São muitas as possibilidades, mas o que de fato aconteceu é que a contribuição para moradia popular não aconteceu conforme planejado pelo Conselho Curador. É muito importante que a Caixa informe os motivos para não buscar os recursos”, avaliou.