“Imaginem como seria se não tivéssemos o Sistema Único de Saúde (SUS) durante a pandemia?”. Pedro Hallal, doutor em epidemiologia, usou o tema do Inspira para evidenciar a importância do nosso sistema de saúde pública durante a maior crise sanitária dos últimos cem anos.
“Apesar de uma série de críticas que temos ao SUS, o Brasil tem um sistema público de saúde copiado e invejado por mais de uma centena de países”. Ele comparou a diferença do Brasil com os Estados Unidos, por exemplo, que cobravam para realizar os testes de Covid-19. No Brasil, embora o Governo tenha demorado para realizar a compra, os testes eram gratuitos.
Outra comparação foi com a Itália, no início da pandemia. Por ser um sistema centralizado, muita gente não teve acesso aos hospitais. No Brasil, disse Hallal, há uma unidade básica de saúde perto da casa dos brasileiros. “Embora a Covid tenha tirado a vida de mais de 650 mil pessoas, com exceção do momento trágico em Amazonas, a verdade é que a maioria conseguiu ser atendida em algum serviço de saúde”.
Se por um lado o epidemiologista enalteceu o SUS, sobraram críticas à condução do Governo. Ele explicou que logo no início da pandemia ele e os demais cientistas brasileiros estavam dispostos a contribuir no enfrentamento da crise, mas foram ignorados pelo governo. “A doença foi tratada com menosprezo. A pandemia era inevitável, mas não devia ter sido como foi, nem matar 650 mil pessoas”.
Hallal citou a disseminação de notícias falsas, a negação da Ciência, o estímulo pela utilização de medicamentos sem comprovação científica no combate à doença como exemplos da desastrosa condução crise.
O olhar para a frente – Para Hallal, a primeira coisa a dizer sobre a solução da saúde pública no país é que ela deve ser coletiva. “É muito chavão dizer, mas muitas cabeças pensam melhor que uma. E a gente deixou que nossa saúde pública fosse guiada por poucas cabeças, as que realmente tomavam decisões, e que infelizmente demos o azar de algumas delas entenderem que a Ciência é do mal ou está toda errada”.
O epidemiologista argumentou que não haverá futuro para a saúde pública sem investimentos em Ciência, educação e tecnologia. Ironicamente, ele diz que este é o momento de maior valorização dos cientistas. Seu receio, entretanto, é que o olhar para a Ciência retroceda quando a pandemia acabar.
Outro desafio, segundo Hallal, é a atenção à saúde mental. “Não dá para imaginar mais saúde pública sem uma lupa sobre a saúde mental. Este vai ser o grande desafio nos próximos anos. Não vai ser fácil lidar com todos os resquícios de uma pandemia que, pe importante frisar, ainda não acabou”, finalizou o cientista.
Pedro Hallal é epidemiologista e professor da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) desde 2005. Ele é também um dos coordenadores do Epicovid-19, o maior estudo epidemiológico sobre coronavírus realizado no Brasil. Hallal está entre os mais citados em trabalhos científicos do mundo em 2020, segundo a lista da Web of Science – ferramenta referencial de citações científicas.