O presidente do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (DEM-AP) alertou o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre um drible do governo federal para vender empresas públicas. Segundo a petição o Executivo tem desmembrado empresas matrizes em subsidiárias com o objetivo de aliená-las sem necessidade de aval do Legislativo. O alerta já havia sido dado pelo Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas junto com a Fenae e a Contraf-CUT, inclusive na esfera judicial.
O questionamento das duas entidades foi expresso na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5.624, ajuizada em janeiro de 2017 no Supremo Tribunal Federal. A ação focou no chamado ´vício de origem´ do projeto que deu origem à Lei 13.303 (Estatuto das Estatais), já que por seu teor deveria ser iniciativa do Executivo e não do Legislativo, como ocorreu, questionando brechas que permitiam a privatização. Em junho de 2018 o ministro Ricardo Lewandowski concedeu liminar proibindo o governo de privatizar empresas públicas sem autorização do Legislativo. A decisão também vedou a venda de ações de sociedades de economista mista, subsidiárias e controladas, abrangendo as esferas federal, estadual e municipal.
Três meses depois uma audiência pública no Supremo discutiu o tema. A proibição das privatizações sem autorização legislativa foi mantida, mas a questão das subsidiárias ficou em aberto, como explica a coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, Rita Serrano. “As entidades novamente questionaram o ministro, mas até hoje isso não foi julgado”, esclarece. Com isso, denuncia, essa manobra já vem resultando em privatizações via subsidiárias, e não apenas na Petrobras, como é citado pelo Senado.
Defesa – “A manobra já ocorre em várias empresas públicas. Na Caixa, por exemplo, foram criadas subsidiárias nas áreas de Loterias, Cartões, Seguros, todas com o intuito direto de privatizar”, afirma Rita, que também é representante dos empregados no Conselho de Administração do banco. Em sua avaliação o questionamento do presidente do Congresso vem de encontro ao interesse do governo em agilizar privatizações, já que em plena crise política, em abril passado, o ministro da Economia apresentou um pseudo-programa para superação da crise intitulado “A reconstrução do Estado”.
“Nesse programa o único foco é a privatização de uma série de empresas. Nada sobre geração de emprego, investimentos ou ampliação dos programas sociais. É um plano que traz informações que não correspondem à realidade e tenta caracterizar as empresas públicas como fonte de corrupção ou pouco lucrativas. Banco do Brasil, Caixa Econômica, BNDES, Eletrobras e Petrobras representam mais de 96% dos ativos totais e mais de 93% do patrimônio líquido das estatais federais e mantiveram a tendência de alta no lucro, fechando 2019 com R$ 107,86 bilhões de ganho. Esse valor representa aumento de 56% em relação a 2018, quando a rentabilidade foi de R$ 69,04 bilhões”, afirma.
Para o presidente da Fenae, Jair Ferreira, a iniciativa adotada pelo Congresso é de extrema importância na preservação do patrimônio público nacional, vez que o STF já se posicionou sobre a obrigatoriedade de o Legislativo ser consultado sobre a venda de empresas públicas. “O governo e seus representantes nestas empresas, inclusive a direção da Caixa, querem destruir, esquartejar, vender parte da Caixa como Caixa Loterias, Caixa Cartões e Caixa Seguridade… Somos contra essas vendas, queremos a Caixa pública e forte para cumprir sua missão de atender a população brasileira. E vamos buscar todas as alternativas para isso, inclusive no Judiciário”, ressalta.
Na avaliação do advogado Luiz Alberto dos Santos, autor da ADI e assessor da Fenae e do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, o governo está, de fato, burlando a decisão do STF. Segundo Luiz, já prevendo que o Ministério da Economia ia seguir por esse caminho do fatiamento das estatais para privatizar subsidiárias ou parte das operações da empresa-mãe, levando a seu esvaziamento, Fenae e Contraf ingressaram em dezembro passado com embargos de declaração para que fosse explicitado que o procedimento é inconstitucional e que, como lembra a petição em foco, configura-se “constitucionalismo abusivo”; ou seja, uma esperteza para contornar uma vedação constitucional.
“Além de ser uma fraude à Constituição é uma medida que lesa o interesse da sociedade e conduz à dilapidação do patrimônio público”, afirma o advogado, na expectativa de que o STF acate os embargos de declaração apresentados, especialmente nesse momento em que o alerta do Congresso vem representar “enorme peso político para isso”.
Mobilização – Com o pedido de liminar feito pelo Congresso para que o STF inclua no acórdão do julgamento que a criação artificial de subsidiárias com vistas unicamente à privatização será considerada ilegal e passível de responsabilização, a coordenadora Rita Serrano reafirma também a necessidade de mobilização das entidades: “O governo quer entregar o patrimônio brasileiro ao custo de banana para multinacionais, e nosso dever como cidadãos e cidadãs é não permitir, ainda mais nesse momento quando é urgente o investimento público”, enfatiza.
O pedido chegou ao STF na tarde de ontem (2) mas, como não teve um encaminhamento direto ao gabinete do relator, ministro Ricardo Lewandowski, será decidido pelo presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, responsável pelas deliberações urgentes durante o recesso do Judiciário, que dura todo o mês de julho.