Na segunda mesa da 19ª Conferência Nacional dos Bancários deste sábado (29) a economista Vivian Rodrigues, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), e o professor Moisés Marques, da Associação 28 de agosto, destacaram os impactos das tecnologias sobre os empregos no segmento bancário e apontaram caminhos para que o movimento enfrente essa nova realidade.

“A migração dos atendimentos em agências físicas para os meios eletrônicos e para o mobile banking já causou estragos enormes na categoria. Mas, agora, os bancos estão partindo para a chamada tecnologia 4.0, uma ‘tecnologia inteligente’ com computadores que têm a habilidade de ‘aprender’ sem a necessidade de serem programados. Essa ‘aprendizagem automática’ explora o estudo e a construção de algoritmos, que permitem aos computadores fazer previsões sobre dados e corrigir seus próprios erros. As máquinas possuem um raciocínio indutivo, extraindo regras e padrões de grandes conjuntos de dados. Até a voz da máquina foi humanizada”, disse a economista.

“Apesar de percebemos que estamos sendo substituídos por robôs, existe sim uma saída para tudo o que estamos vendo. Não podemos brigar contra a tecnologia, mas podemos brigar contra os efeitos de sua implantação e apontar os problemas e os prejuízos que podem ser causados”, afirmou o professor Moisés Marques.

Pioneirismo do Bradesco
O Bradesco foi o primeiro a utilizar essa tecnologia (Watson/IBM) em língua não inglesa. O “Bradesco Inteligência Artificial (BIA)” está sendo usado por enquanto apenas para esclarecer dúvidas de funcionários, mas o projeto é para que, em breve, seja utilizado no atendimento aos clientes.

Os gerentes de relacionamento alimentam, diariamente, a BIA com 22 mil perguntas e respostas. A tecnologia já responde a 94% das perguntas dos funcionários das agências. São 65 mil usuários diretos e milhões indiretos.

Cada um a sua maneira, os bancos demais bancos também estão fazendo uso da tecnologia. No Santander, “o novo bancário é um cyborg” os humanos são utilizados para dar humanidade ao atendimento. Mas, as informações passadas aos clientes devem estar de acordo com as do “cyborg”, e são cobrados para que o atendimento humano não seja pior do que o da máquina. “A ideia, também, é a de que, muito em breve, os clientes tenham o acesso direto às maquinas”, disse Vivian.

No Banco do Brasil uma característica marcante é a implantação do teletrabalho e, no Itaú, as agências totalmente digitais, com atendimento das 8h às 22h.

Novo modelo de banco
Como características gerais desse novo modelo de banco no Brasil, a economista do Dieese destacou a inserção no contexto da “4ª Revolução Industrial”, com sistemas ciberfísicos; a transformação dos bancos em plataformas financeiras (indústria de dados), com importante papel quanto à regulação do sistema; maior digitalização e investimentos em tecnologia (R$ 18,6 bilhões em 2016); o desenvolvimento de novos produtos financeiros, como as startups/fintechs; mais de 1 milhão de contas abertas “100% digital”, podendo chegar a 3 milhões em 2018; a consolidação dos canais digitais (internet e mobile banking). “As transações via agências caíram de 18% para 8% do total, entre 2008 e 2016. Já as transações via smartphones avançaram e já passam de 1/3 do total. As agências físicas ainda vão existir. Mas, em número reduzido. Não é preciso nem falar que os impactos no emprego serão enormes e que haverá necessidade de mudança do perfil ocupacional dos trabalhadores”, observou a economista.

Com a aprovação da possibilidade da contratação de trabalhadores terceirizados até para as atividades fim e da reforma trabalhista, os impactos que novo modelo de banco traz sobre o emprego e sobre o perfil dos trabalhadores serão ainda mais drásticos. Serão ampliadas as chamadas novas formas contrações, que implicam em relações trabalhistas precarizadas. “Mas, os bancos e demais empresas vendem um mundo maravilhoso, com o trabalhador como dono de sua agenda e de seu negócio. Os direitos são meros detalhes. Aproveitam a ânsia de mudança de uma geração de trabalhadores jovens, para oferecer o efêmero”, destacou o professor da Faculdade 28 de Agosto.

Novo discurso
Moisés Marques destacou a importância de o movimento sindical afinar o discurso para atingir a parcela mais jovem da categoria, que já representa grande parcela dos trabalhadores. No Itaú já são 70% dos funcionários. “Estamos preocupados com a digitalização dos bancos, com estabilidade no emprego e as consequências da flexibilidade da jornada, mas a chamada ‘generation me’ (geração eu) é nativa digital, muda constantemente de emprego, são multitarefas e gostam de flexibilidade, inclusive em contratos de trabalho”, alertou. “Temos que mostrar os prejuízos que este novo modelo de banco esconde atrás de um mundo de faz de conta. Não apenas para o trabalhador, mas para os clientes”, disse.

Em sua apresentação, o professor usou como exemplo uma notícia de agosto de 2012 do Financial Times, que noticiou que o defeito num robô responsável por automatizar transações na Bolsa de Nova York provocou um prejuízo de US$ 440 milhões para a companhia responsável pela atualização de um software. Outros casos citados pelo professor foram informações de que as fraudes virtuais cresceram 500% em 2015 no Brasil; que uma pesquisa de 2016 revela que 38% das organizações financeiras têm mais dificuldades em detectar fraudes com o atual cenário tecnológico mais complexo; que apenas 57% das instituições financeiras têm bons sistemas de segurança antifraude.

“Temos que levantar esses e outros problemas desse novo modelo bancário e alertar aos trabalhadores e aos clientes sobre os riscos desse novo modelo”, disse Moisés.

Novas formas de mobilização
Para enfrentar o problema, o professor da 28 de Agosto disse que não devemos abandonar as formas de atuação que utilizamos hoje, mas incorporar novas formas de mobilização como:
Trabalhar junto aos organismos reguladores (BACEN, CVM), no sentido de exigir regulação para conter fraudes e manter estruturas robustas de compliance e controles internos à Novas necessidades de certificação;
Participar ativamente de audiências públicas para regulação de novas tecnologias à Acionar a Justiça, em caso de necessidade;
Pressionar os representantes do legislativo;
Criar uma comunicação mais direta e ativa (utilizando a tecnologia) com clientes e sociedade (mostrar riscos, problemas e dilemas);
Criar um canal de denúncias de problemas nas operações de bancos digitais
Pensar em “sindicatos digitais” e “mobilizações virtuais”
Flash Mobs; Performances Rápidas; MKT de Guerrilha; Ciberativismo
Uso de games com função política e social (Molleindustria)
Articular nossas reivindicações com outras questões importantes da sociedade, como: xenofobia, racismo, machismo, intolerância, causas humanitárias, defesa do consumidor, etc…
Negociar “formação” e “transição” para equilibrar relação capital x trabalho

Veja íntegra das apresentações do Dieese e da Associação 28 de Agosto.

A 19ª Conferência Nacional dos Bancários continua nesta tarde com mais duas mesas. Na primeira o senador Roberto Requião (PMDB/PR), o coordenador do Dieese, Clemente Ganz Lucio, e a professora da UFMG, Daniella Muradas ajudarão na reflexão sobre a reforma trabalhista. Na segunda, a professora da UFRJ, Denise Lobato Gentil, fará a reflexão sobre a reforma da Previdência.

O encerramento ocorre no domingo (30), quando os delegados debaterão e aprovarão o plano de lutas da categoria para o próximo período.

Fonte: Contraf-CUT

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