Parado durante dois anos, na gestão Jair Bolsonaro (PL-RJ), o Projeto de Lei 3588 teve a sua tramitação retomada nesta quarta-feira (27), em audiência pública, na Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados. Além dos parlamentares, participaram dirigentes de centrais e de entidades sindicais bancárias e de diversas outras categorias, além de representantes do governo federal.
O PL 3588, de autoria do deputado Alexandre Padilha (PT-SP), hoje ministro das Relações Institucionais, apresentado em 2020, prevê que o governo deverá editar uma norma regulamentadora (NR) com medidas de prevenção e gestão de riscos no ambiente de trabalho, que podem afetar a saúde mental dos trabalhadores (riscos psicossociais).
O presidente da Comissão, Airton Faleiro (PT-PA), ressaltou a importância do projeto para os trabalhadores e a necessidade de haver celeridade no seu andamento. E acrescentou ser fundamental a realização da audiência pública para que a sociedade possa se manifestar sobre a proposta e aperfeiçoá-la.
O relator da proposta, deputado Carlos Veras (PT-PE), destacou que o objetivo da audiência foi colher informações que possam enriquecer o teor do relatório de apresentação do projeto. “O PL será submetido ao debate e votação na Comissão, brevemente”, disse.
Jeferson Meira, o Jefão, secretário de Relações de Trabalho da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), participou dos debates e falou sobre a importância do projeto de lei. “Até aqui, existem somente normas regulamentadoras com medidas de prevenção a doenças físicas. Diante do crescimento do número de adoecimentos psíquicos é necessária uma NR específica para tratar do assunto”, afirmou, ao lembrar que a categoria dos trabalhadores do ramo financeiro está entre as que mais sofre com pressão sistemática, sobretudo por cobrança de metas excessivas, que abrem espaço para o assédio moral, além da sobrecarga de trabalho, por conta do nível elevado de demissões no setor. Logo, esses trabalhadores estariam entre os mais beneficiados com a aprovação do PL 3588.
Segundo a Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho (EU-Osha, na sigla em inglês) entre os fatores que aumentam os riscos psicossociais estão carga de trabalho excessiva, falta de clareza na definição das funções, má gestão de mudanças organizacionais e assédio.
Durante a audiência, Mauro Sales, secretário de Saúde da Contraf-CUT, enfatizou que as doenças psíquicas relacionadas ao trabalho não têm a visibilidade necessária. “Tem campanha sobre doenças infecciosas, Aids, sarampo, o que é muito importante. Todavia, não vemos esta preocupação com acidentes e doenças do trabalho causadas pelas empresas. Esta audiência contribui para dar visibilidade a este tema tão grave e importante”, constatou.
Categoria
Mauro lembrou que mesmo subnotificados, os acidentes de trabalho vitimam mais que acidentes de trânsito, violência urbana e mesmo guerras. Frisou que houve retrocessos em outras normas regulamentadoras em governos passados (Temer e Bolsonaro) que prejudicaram os trabalhadores.
“Nossa categoria tem sido afetada pela gestão dos bancos, por afastamentos mentais e comportamentais, casos que subiram de 30% em 2012 para 57% em 2022. Isto mostra que há uma verdadeira epidemia porque as empresas estão adoecendo os trabalhadores, devido ao assédio moral”, acrescentou. “Este projeto de lei é um passo contra o risco psicossocial”, enfatizou.
Viviane Fortes, do Ministério do Trabalho, ratificou as informações de Mauro sobre os problemas de saúde mental verificados nos bancos. Cirlene Zimerman, procuradora do Ministério Público do Trabalho, disse que os fatores psicossociais impactam a longo prazo. Mas ao contrário do adoecimento físico, têm causas que, muitas das vezes, não estão visíveis. “Este projeto de lei propõe trazer o tema para a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) a fim de garantir esta proteção específica a todos os trabalhadores”, disse.
Ana Grudtner, da secretaria de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, afirmou que as mudanças no mundo do trabalho têm aumentado o sofrimento, ocasionando crescimento dos riscos de adoecimento mental, principalmente a precarização das relações de trabalho e a diminuição dos direitos sociais. “O trabalho, então, acaba sendo um fator de risco. Muitas vezes não temos autonomia, convivemos com uma série de assédios, alta competitividade, elevada exigência de produtividade. São diversos fatores psicossociais que vão acabar impactando a nossa saúde mental”, exemplificou. Ela ainda acrescentou ser preciso uma legislação que proteja os trabalhadores deste tipo de adoecimento.
Bolsonaro travou projeto
O relator do PL 3588 na Comissão de Trabalho, deputado Carlos Veras (PT-PE), deve defender o PL e justificar a sua aprovação. Aprovada, a proposta seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça e depois para votação em plenário.
No governo Bolsonaro, as NRs passaram a ser editadas pelo Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes, o que travou definitivamente o andamento do PL na Câmara dos Deputados, já que não era do interesse do governo passado, qualquer medida benéfica aos trabalhadores.
Em 2020, na apresentação da proposta, Padilha lembrou que vários estudos científicos abordam a questão dos riscos psicossociais nos diversos segmentos de atuação. “Todavia, é evidente a ausência de medidas reguladoras de enfrentamento e intervenção, capazes de minimizar os riscos e danos causados, muitas vezes, por desconhecimento, gestão e até negligência do empregador”, disse.
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